Este post faz parte de uma série cujo objetivo é servir de guia e oferecer dicas para escritores iniciantes. Caso você queira conferir os artigos anteriores, clique em “Guia do Escritor Iniciante”. Boa leitura!
O Manual de hoje é sobre uma ferramenta de trama qual o uso é, no mínimo, duvidoso. É possível que vocês já tenham visto esta expressão em críticas literárias ou de filmes, e que costuma ser apontada com uma falha da obra.
Estou falando de Deus ex machina.
A expressão vem do latim derivado do grego, e significa “deus na máquina”. O uso de Deus ex machina se dá quando a história chega em uma situação extremamente difícil de resolver, ou que sequer parece ter resolução. E, então, feito milagre, ocorre um evento fantástico que muda o rumo da trama e resolve o conflito.

O uso indiscriminado de Deus ex machina a transforma em uma “muleta” para a trama, e existem poucas coisas mais entediantes do que um protagonista que tem todos os seus problemas resolvidos num passe de mágica.
Mas, ao mesmo tempo, é uma ferramenta de trama muito difícil de NÃO usar, porque, às vezes, o autor a coloca no texto inconscientemente, ou até por acidente.
Alguns escritores famosos usaram deste recurso em suas obras. Em A Guerra dos Mundos, de H. G. Wells, os alienígenas parecem indestrutíveis, deixando ruínas e morte por onde passam, e não há o que a humanidade possa fazer para pará-los… Até que eles sucumbem para bactérias.
O próprio Tolkien considerava as Grandes Águias um perigo para a sua trama, porque tudo poderia ser conquistado com a ajuda delas. Elas poderiam até levar o Anel para Mordor e acabar com a história em poucas horas.

Ainda assim, na obra de H. G. Wells, o acontecimento pode ser argumentado como crítica ao pensamento dos humanos como únicos habitantes da Terra, e que a arrogância dos alienígenas em apenas se prepararem para enfrentar a “espécie dominante” do planeta foi o fim deles.
Tolkien reconhecia que usar as Águias para tudo seria uma escolha narrativa pobre, tirando a chance dos Hobbits de resolverem seus próprios problemas. Assim, colocou uma série de restrições para o trabalho das Águias em Senhor dos Anéis.
No geral, evitar soluções por Deus ex machina cria tramas mais complexas e envolventes do que com sua utilização. Logo, é melhor evitar.
Algumas formas que Deus ex machina pode tomar:
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Num conflito, um personagem descobre que tem uma habilidade ou um objeto que não foram previamente mencionados, e, com isso, ele é capaz de resolver toda a situação;
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Tudo indica que, para este protagonista, não há outra saída senão a morte. Então, um deus/ser fantástico/ super-herói surge do nada e o salva;
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Os planos do antagonista maligno são detidos por uma série de coincidências bizarras que ninguém influenciou, ao menos não de forma consciente;
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Foi tudo um sonho!

A linha entre uma solução inovadora e um Deus ex machina é mais tênue que parece, e é sempre importante revisar a obra, não só pela questão gramatical ou o ritmo da trama, mas também pela qualidade das soluções que você encontra para conflitos. Os leitores gostarão delas, ou as acharão fracas e mal planejadas?

Mas ainda há um porém neste assunto: se é tão ruim, porque aparece tanto em obras clássicas?
Originalmente, Deus ex machina era usado para mostrar a intervenção dos deuses no plano terreno, nas tragédias gregas. Mesmo lá na Grécia Antiga, havia críticas ao seu uso, mas a presença divina e o impacto dos deuses na trama era do gosto do público, e a exaltação das divindades como algo superior ao humano que esta ferramenta proporciona ainda é importante em textos religiosos. Quando, na construção de mundos, se escreve a base da religião daquele lugar, Deus ex machina ser presente nos textos religiosos não é mal.
Outra forma de usá-la efetivamente é na comédia. A mudança abrupta após a apresentação de um problema grave pode ser bem engraçado.

Portanto, descartando a “forma fácil” de solucionar conflitos, você cria histórias melhores. Deus ex machina tem o seu espaço literário, mas só o use com MUITA moderação, e procure sempre revisar seu texto para ver se não acabou escrevendo um, acidentalmente. Porque, se você ficar se apoiando nele, só um milagre para salvar seus leitores do tédio ou da decepção.
Até breve!
”Ler 400 páginas e descobri que é tudo um sonho” hahahah se fala muito disso em teorias de The Walking Dead, a série nunca mostra um final ou um caminho para ele haha será ?
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Haha, já ouvi falar desta teoria, e olha que é provável. Essa série sempre me pareceu meio sem rumo, ainda mais nas últimas temporadas. Seria um final péssimo xD
Abraços e boas leituras!
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Seria mesmo, eu mesmo era super fã mas abandonei ela faz um tempo.
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Você não é o único, Paulo x.x
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Chorei de rir com “foi só um sonho” muita mancada!! hahahaa
Adorei o texto, não conhecia o termo, apesar de conhecer o uso na literatura. Foi ótimo aprender mais.
osenhordoslivrosblog.wordpress.com
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Meu professor de redação, no cursinho, já advertia contra este tipo de “sonho” xD
Sempre bom conhecer mais sobre um assunto! Só sabendo as regras é que podemos quebrá-las 😉
Abraços e boas leituras!
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Essa do sonho o pessoal adora usar em teorias também!!! Tudo o que é inexplicável em livro, série, filme… ou é um sonho ou tá todo mundo morto e pelo menos um tá delirando!!!
Se não me engano, os fãs de Harry Potter estavam morrendo de medo de ser tudo um sonho dele, antes de lançar o último livro!!!
https://srtagiuliarodrigues.wordpress.com
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É a teoria mais fácil de se inventar porque praticamente qualquer cenário incomum pode ser interpretado como um sonho. As pessoas relevam o fato que até o universo onírico tem a sua própria linguagem, possibilidades e limitações, já que tantos autores usam sonhos como a melhor explicação para as maluquices que eles inventam antes de decidir o desfecho da trama.
Eu lembro dessa teoria de HP, e também a que o anime do Pokémon era, na verdade, o Ash em coma! Vai entender.
Abraços e boas leituras!
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Muito interessante as informações.
Eu desconhecia esse significado.
Parabéns pelo post.
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Obrigada Bruno! Sempre procuro trazer coisas novas 😉
Abraços e boas leituras!
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